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PROGRAME-SE: Como a internet tem mudado o modo de se fazer telejornalismo?

 

JULI WEXEL: Na verdade, a internet tem mudado tudo. Em comunicação então, essa mudança ainda tá muito mais permeada por dúvidas, questionamentos, do que propriamente certezas. Hoje quando a gente fala de televisão, a gente tá falando de um suporte que a maioria das pessoas tem acesso, e ela mesma precisa se reinventar diante da velocidade que as informações e que as relações se estabelecem na internet.  Então esses aspectos, esses elementos, eles estão sim, mexendo muito com os profissionais que trabalham com televisão. Porque a televisão, na sua origem, ela tinha praticamente uma via de mão única. Hoje na internet as pessoas tem a liberdade de interagir com a informação que elas querem, e de ter acesso a isso muito rápido. A qualidade da informação na televisão, em se tratando de jornalismo, ela é muito pautada também pela influência dos outros meios de comunicação: rádio, jornal e televisão, se comunicam em termos de pauta. E a internet hoje está fazendo isso com todos os veículos. Ao mesmo tempo, as dúvidas são muito maiores que as certezas. A comunicação está sendo muito híbrida. E quando a gente fala de jornalismo, aí a qualidade da informação precisa receber uma maior atenção. Então assim, a forma que a internet trabalha com a informação é múltipla. Mas a qualidade da informação que precisa passar por esse crivo do que a gente chama de jornalismo. Por isso muita gente fala: o jornalismo tá morrendo? Ele tá mudando? A velha forma de fazer jornalismo talvez sim. A gente tá num momento de transição muito grande em relação a tudo isso. Na verdade, é uma grande massa de coisas acontecendo, uma grande massa de linguagens se misturando, onde até mesmo a ficção vem ajudando a gente a contar uma história verdadeira, né? Hoje você não pensa mais necessariamente numa narrativa linear, porque nós estamos pensando em links já. Hoje as pessoas tem um acesso muito mais direto aos veículos de informação e elas se tornaram mídias. As pessoas são mídias. E o nosso desafio, como jornalistas que fazem produto audiovisual para a tela, seja qual for o produto, nosso desafio é tornar isso interessante, educativo, que alcance esse público que já tá muito acostumado com estímulo visual, com referências, com informações. E também o nosso desafio passa pela qualidade do conteúdo. Porque o jornalismo também é crítico. Ele presta um serviço. Ele tem uma responsabilidade. E o jornalismo é um ofício difícil de se fazer. Não basta apenas você contar uma história, você tem que olhar para todos os lados dessa história. Então, a gente dentro do telejornalismo, que lida com o tele, com a tela, estamos sendo permeados pelas múltiplas telas. E o ritmo é diferente, o ritmo anterior da televisão era um, o tempo das coisas era outro. O tempo de se passar informação era monopolizado. Porque você não tinha o recurso da internet para fazer isso. Você não tinha uma pessoa com um celular podendo estar no local do acontecimento e ela mesma poder relatar. Então eu acredito que o telejornalismo passa a ter uma importância fundamental nessa qualificação da informação. Porque a dificuldade de você muitas vezes checar uma informação pela velocidade com a qual ela passa pela rede é justamente uma das questões éticas. Por isso que é difícil você dizer que qualquer informação é de cunho jornalístico. Não necessariamente.

 

PROGRAME-SE: Quais as principais mudanças que a tecnologia tem causado na produção televisiva?

 

JULI WEXEL: Eu acho que a internet traz muito mais criatividade. Eu, particularmente acho a televisão brasileira muito criativa. Não é a toa que é considerada uma das melhores ou mais interessantes televisões do mundo. Ultimamente, eu tenho olhado um pouco no YouTube coisas antigas, programas de humor, programas de jornalismo mesmo.  E eu acho que ela inspirou muito e ela inspira muito a academia, as universidades, a fazerem, no caso do jornalismo, do telejornalismo, um modelo. Esse modelo precisa ser revisto porque as pessoas acabaram se formando para um certo modelo e ao mesmo tempo a internet veio bagunçando tudo isso. Então, eu acredito que para que uma mudança mais interessante possa acontecer, na formação do profissional que atua na área de jornalismo, por conta dessa metamorfose ambulante que a gente vem vivenciando, é rever não só o olhar pras novas tecnologias enquanto forma, forma de distribuição. Mas de criação, aí você precisa do design, você precisa das outras artes, da literatura, pra isso. E não se fechar numa caixinha de um curso de jornalismo tecnicista que só trabalha com as velhas formas. E mais, além de você trabalhar com as formas, você precisa trabalhar o conceito. O conceito do que você está fazendo.  Para você construir um bom roteiro, para você entender uma boa história, você precisa do pensamento crítico, você precisa aprofundar. Então, ao mesmo tempo que a gente está distribuindo muita coisa, a necessidade de aprofundar as análises, aumenta.

PROGRAME-SE: Você pensa em quem vai consumir o conteúdo por outras telas?

 

JULI WEXEL: Sim. Inclusive, a gente procura produzir pensando já nisso. Até porque eu penso que a gente precisa ter respeito pelo tempo das pessoas. O tempo hoje é a matéria prima das nossas vidas. E um dos elementos dos quais a gente mais precisa. Então você conseguir prender a atenção de alguém, isso é precioso. Isso é incrível. Eu dou muito valor a isso. Quando eu entro no ar e eu olho pra câmera, eu mando energia sim pra quem tá em casa. E eu procuro trazer a verdade daquilo que nós, enquanto editores, enquanto repórteres, trazermos para o produto, no caso, o Jornal Futura. Justamente nessa era, onde um montante de estímulos cresce numa esfera exponencial, você ter a atenção de alguém, de um leitor, de um telespectador, isso é é rico. Talvez seja um dos motivos que eu ainda esteja em comunicação. Para cumprir um serviço. Mas, enfim, a gente acaba colocando fragmentos do nosso programa na internet, mas na verdade é muito difícil hoje você ver realmente uma televisão que está produzindo para internet ao mesmo tempo. Existe uma tentativa de se fazer, encaixar o produto televisivo na internet. Você vê muito isso. O YouTube esse ano [2015] completa dez anos! E nesses dez anos de existência do YouTube, houve a grande explosão de produção audiovisual. Hoje você tem cinema no YouTube, você tem publicidade no YouTube, você tem webjornalismo, você tem todos os segmentos que você veria numa tela comum, ali dentro. É a tela de visão mais democrática do mundo, o Youtube. Então, essa tua pergunta, eu acredito que todas as televisões, assim como todos os jornais vem pensando. Como produzir para a internet? Sair da sua plataforma original pra migrar pra essa múltipla plataforma. Tudo tá muito baseado nas experiências, nas experimentações. E isso eu acho que é muito bacana. Você percebe uma dificuldade do mercado, inclusive, em termos de sustentabilidade por causa disso também. Porque da mesma maneira que está havendo uma difusão muito grande na distribuição, você vê as empresas de comunicação tendo que rever o seu escopo de funcionários, que perfis se quer. Tendo que enxugar os seus orçamentos, porque a gente está num momento de crise. E isso afeta cultura e comunicação diretamente. Então, é um momento de muitas dúvidas e essas dúvidas são muito saudáveis pra gente sim, até pra gente se reinventar.

PROGRAME-SE: É possível pensar em um perfil para o público contemporâneo?

 

JULI WEXEL: É difícil. A gente sempre tenta fazer um recorte do público que a gente tá falando, mas é difícil. Atualmente [2015], o público que eu estou falando é um público de nove milhões de pessoas, no Brasil inteiro. De norte a sul, leste a oeste. Eu tô falando com muita gente. Eu tô falando com criança, com jovem, com adulto, com idoso, com trabalhador, em diferentes horários. No nosso caso, a gente tem uma faixa de programação múltipla. Eu entro ao vivo às cinco, a reapresentação acontece às oito, à meia-noite, às sete da manhã. Então, você não sabe exatamente pra quem você tá falando. É por isso que é importante você saber o que você está falando e perceber o tamanho da responsabilidade que é isso. Você entrar no ar. E dar uma frase. Independente se for ao vivo pela internet, se for ao vivo pela televisão, pelo rádio, ou se você escrever isso numa rede social. Nunca foi tão importante a gente dar valor a linguagem. E nunca foi tão importante a gente pensar nessa responsabilidade. Porque quando cai na rede, isso se torna praticamente irreversível.

PROGRAME-SE: Como pode vir a ser, então, a TV do futuro?

 

JULI WEXEL: Uau! Eu acho que na verdade não é uma TV, são TVs. Esse conceito de um tipo de veículo de comunicação específico, a própria rádio também tá se reinventando com o streaming, com a possibilidade de você ouvir o que você quer, de assistir o que você quer, na hora que você quiser. Se a gente pensar de uma maneira bem futurista mesmo, eu acho que na verdade é o público que vai comandar tudo. Na verdade a gente vai produzir e disponibilizar isso e as pessoas vão assistir na hora que elas quiserem, que for conveniente pra elas. Eu acho que essa possibilidade de múltiplas telas dá a possibilidade do público escolher. Muito mais que a gente. É... Netflix! (Riso) Porém, eu acho importante a gente puxar um pouco o balão do futuro para agora e entender que isso também depende do acesso. Quando a gente fala de um público super heterogêneo, a gente tá falando num público heterogêneo em termos de condição socioeconômica. Então, não é todo mundo que tem acesso a isso. A construção cultural- social do Brasil, se a gente falar de Brasil, é muito heterogênea. Você precisa melhorar a educação da população, muito. Então o acesso às novas tecnologias e aos meios de comunicação também dependem de decisões do governo, da iniciativa privada, de uma série de condições pra isso. Então você pode até ter uma big nova televisão disponível, onde você tem acesso a tudo, mas esse acesso depende da condição que a população também tem. Então, não dá pra esquecer dessa ponte que é muito necessária, quando a gente pensa num acesso de, de uma televisão possível e incrível no futuro. Eu não acredito que a televisão vá morrer. Aquele velho papo, né? Do livro, do cinema, do rádio, uma coisa se sobrepondo a outra. Não. Eu não vejo assim. Mas há uma necessidade de reinvenção também. E acho que existe espaço pra TV super convencional também. Ainda há público. Nós estamos consumindo, consumindo tudo, o tempo inteiro. Até que ponto a gente não tá contribuindo pra esse frenesi, que tem deixado tanta gente mais perdida do que informada? Eu questiono isso também.

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