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PROGRAME-SE: Qual o espaço do documentário na TV hoje?

 

LUÍS NACHBIN: Analiso com a esperança de que ganhe mais espaço. Acho pequeno. Acho que o produto documentário teria o poder e tem a capacidade de certa forma, de abraçar um público muito mais amplo do que de fato ocupa na TV brasileira. As pessoas gostam dos documentários. Pessoas da classe A á classe E, de faixas etárias diferentes. O que eu acho é que para o documentário se popularizar, para entrar mais no dia-a-dia das pessoas, no gosto das pessoas, ou se integrar mais ao cotidiano das pessoas, teria que ocupar um espaço mais nobre. Mais nobre em termo de frequência, e mais nobre em termo de horário. Não apenas, o que já é bom ter documentário lá no canal ‘X” às vinte três e trinta ou então a meia-noite, ou séries de documentários esporádicas, ótimo que elas existam. TV frequência seria fundamental. Em horários melhores também. E na TV aberta. Porque a TV aberta não mostra documentário? Grande parte da nossa audiência ainda consome, majoritariamente TV aberta. Todo mundo. Por que que as TVs abertas não mostram documentários em seus horários nobres ou quase nobres? Por que o documentário tem um ritmo que talvez não desse, talvez temáticas que não dessem o ibope necessário? Mas essas temáticas podem ser trabalhadas para dar o ibope necessário. Os ritmos podem ser trabalhados pra gerar o ibope desejado. Enfim, eu acho que há também um certo preconceito sobre o formato por mim tão querido, que é o documentário.

PROGRAME-SE: E como você pensa o lugar do público no processo de produção de um documentário?

 

LUÍS NACHBIN: Eu penso, em geral, no público adulto. Adulto, dezesseis, dezoito anos pra cima. TV de forma bem ampla. Bem ampla mesmo. Não me pego pensando em estudante de comunicação, ou engenheiros, ou em classe C, ou classe A, ou classe tal. Me surpreendo, por exemplo, quando amigos meus dizem que os filhos assistem aos documentários e gostam dos documentários. Por que como falei, não penso nas crianças. Um pouquinhos nos adolescentes. Em geral no público, enfim, que possa navegar, fluir pelas sutilezas do documentário, dos documentários que a gente produz. Além das obviedades. E talvez haja também da minha parte, um certo preconceito sobre a capacidade da criança do adolescente absorver essas tais sutilezas. Ou, talvez as sutilezas que eles absorvem, as crianças e os adolescentes, são outras que eu nem imagino, que eu não vejo, que para mim são nebulosas ou inexistentes. Eu gosto sempre de fazer televisão pensando em todo mundo. Sabendo que ninguém assista (risos). TV enfim, que possa agradar a todos em potencial.

PROGRAME-SE: Atualmente, está mais difícil fazer TV?

 

LUÍS NACHBIN: Não. Acho que a TV tem que acompanhar o ritmo de evolução de linguagem. De certa forma dialogar ainda com as alternativas que existem. As tantas alternativas, mais e mais que têm por aí. Para os meus alunos na PUC do Rio, eu nunca gosto de categorizar e criar uma fronteira entre o documentário para televisão e o documentário para cinema. Um bom documentário para cinema talvez ajustado, recortado, reeditado cabe super bem na televisão, e flui bem na frequência. Então essa fusão, essa mescla, entre as características das várias mídias, tem que fazer com que cada mídia evolua, ande para frente. E eu vejo a linguagem da televisão andando pra frente. Talvez não no ritmo que poderia ser, algo mais legal, mais inspirador. As TVs abertas estão mais conservadoras. Tendem a ser mais conservadoras. As fechadas, segmentadas são mais fechadas também, outras mais, outras arriscam um monte até, arriscam muito, né? TV é isso. Tem que olhar pro lado, tem que ver o que que tá acontecendo. O que outras mídias estão fazendo, de que forma, e se inspirar. Ou sugar mesmo, ou “apenas”, apenas entre aspas, porque já é muita coisa, usar como alavanca pra novas maneiras de construir.

PROGRAME-SE:  Como agradar um público tão exigente?

 

LUÍS NACHBIN: Em primeiro lugar, mostrar novidades. A imensa parte da população brasileira já nasceu com televisão. Muito provavelmente, cinquenta por cento ou mais da TV brasileira da população brasileira acessa internet, tem acesso a todas as mídias que existem. Uma boa parte não tem dinheiro para ir ao cinema. O primeiro elemento, então, é a novidade. A novidade pode estar no conteúdo, como pode estar na narrativa. No jeito de montar, no jeito de filmar. No jeito de juntar imagens reais com videografismos, com animações. No jeito de construir áudios diferentes, trilhas. Na TV com novidade. O público adora novidades. Agora, construir novidades, televisão é um business, e construir novidade implica num risco. Que é o risco da rejeição. Então, claro que não dá para, pelo menos na grande maioria das emissoras, das TVs, não dá pra, digamos, “pirar” e partir para o horário nobre. Experimentações, em qualquer laboratório ou nas televisões, quaisquer que sejam, são feitas pouco a pouco, gradativamente.  Novidade no conteúdo, coisas novas. Novidade na forma, na maneira de contar.

PROGRAME-SE: Quais as principais alterações que a tecnologia causou em seu modo de trabalhar?

 

LUÍS NACHBIN: Quando eu comecei a fazer televisão, comecei como repórter convencional. No idos de mil novecentos e noventa e sete, quando eu peguei uma câmera e fui para o mundo para fazer documentários, a qualidade, era uma câmera grande, nem tão grande assim, a qualidade técnica da imagem era questionável. Aí, para ter qualidade alta, eu resolvi partir para um equipamento pesado. E um equipamento pesado tira um pouco da mobilidade. Ainda mais numa “equipe”, entre aspas, solitária, como é o meu caso. Então a tecnologia, ao gerar câmeras portáteis, modelos super variados, modelos adequados a diferentes situações, me gera um potencial de versatilidade que quando eu comecei, em noventa e sete, eu nunca poderia imaginar. A tecnologia faz com que a minha linguagem, linguagem dos documentários dos quais eu participo, se torne, eu acho, múltipla. Ao menos, mais variada mesmo. Por conta do potencial de ferramentas que eu tenho pra escolher, dependendo da temática, dependendo da forma de contar a história. Dando um exemplo, na reta final dos Entre Fronteiras África, há muito tempo eu não usava uma GoPro, eu levei duas porque eu fui fazer um documentário sobre as motocicletas de Kampala, capital de Uganda. Que é a cidade que o índice de moto táxi, moto boy, moto enfim, muito alto. E aí, GoPro aqui, GoPro ali. Levei uma outra câmera portátil, que não é GoPro, enfim. Isso me deu um horizonte, isso me gera um horizonte de criação que tempos atrás, eu não tinha. E esse horizonte de criação imprimi, claro, na montagem. E me dá a chance, por exemplo, nesse documentário, da alternância de ritmo. Às vezes ritmos super cortados, rápidos, dinâmicos, pops, comerciais, enfim, o rótulo que quiser dar. E às vezes ritmos mais contemplativos, mais cinematográficos.

PROGRAME-SE: Quais as principais vantagens e desvantagens da tecnologia?

 

LUÍS NACHBIN: Não sei. Nos transformar a todos nós, em videomakers, cineastas? Há uma infinidade de coisas para ver. Eu, na minha escrivaninha, tenho ali um pen drive, na gaveta vários DVDs esperando que sejam vistos por mim, em algum momento. Então, eventualmente, essa avalanche, essa imensidão de produtos audiovisuais talvez possa ser um pouquinho intimidadora. É tanta coisa, coisas boas, coisas mais o menos, coisa de qualidade baixa. Talvez eu tenha um certo romantismo de quando as câmeras não eram tão fáceis, tão fartas. E as pessoas de alguma forma, teriam que se juntar e compartilhar uma câmera e pensar um pouco melhor antes de partir para um produto audiovisual. Ao mesmo tempo saem coisas geniais que a gente vê pela internet ou em canais de televisão. Coisas geniais de um sujeito que pegou uma câmera ali e tal, o seu celular e pum! Foi embora. Filmou e montou.

PROGRAME-SE:  A TV está conseguindo estabelecer uma interação efetiva com o público?

LUÍS NACHBIN: Se eu tivesse que dar uma resposta assim, simplista, eu diria que não. Eu diria que a televisão tem que olhar pro lados e como eu comentava agora há pouco, trazer mais daqui, absorver mais dali. Ousar mais. Botar mais cabeças jovens, orientadas por cabeças mais velhas, enfim. Fazer essa fusão melhor. Entre concepções um pouquinho mais antigas, com possibilidades novas de fazer. É de certa forma inevitável que a TV perca um pouco da sua audiência. Ou perca talvez até muito da sua audiência em função das outras alternativas. A TV precisa se mexer mais. Não acho que a televisão vá acabar. Que daqui a vinte anos ninguém jamais vai se sentar na sala para assistir a televisão. Enfim. Ouvimos rádio. Continuamos ouvindo rádio. Ouvimos rádio de maneira diferente. Ouvimos rádio no celular hoje em dia. Vemos TV no celular. Nos sentamos menos na sala, a família para assistirmos juntos a programação da televisão. Vai havendo a evolução, né? O mundo é dinâmico. As transformações tecnológicas levam a TV a mudar o tempo inteiro. Eu tenho a sensação que os programadores de TV, os executivos das TVs, de uma maneira geral, meio chato generalizar, porque há TVs que fazem coisas super legais, são vanguardistas e pensam e tal e que interagem, criam interseções com outras mídias. De uma maneira geral, andar mais pra frente e com mais rapidez, pra abraçar, pra não continuar deixando esse público jovem, que busca alternativas, que tem vários acessos, deixar esse público escapar.

PROGRAME-SE:  Quais as suas perspectivas para o futuro da TV?

 

LUÍS NACHBIN: O Nachbin espectador aguarda pela televisão repleta de documentários. Em horários nobres, sobre vários assuntos, ouvindo mais as pessoas, falando menos, interagindo de várias maneiras, de maneiras mais informais. A minha previsão não é otimista, não sei se eu sou otimista. Eu não sou fatalista, de dizer que vai acabar ou vai minguar tremendamente. Processos de transformação cada vez mais rápidos. Aonde vamos parar? Eu não faço a mais vaga ideia. Eu tô com cinquenta anos. Minha filha mais velha tem sete, e eu espero ser avó ainda, espero viver bastante. E acho que sei lá, daqui a trinta, quarenta anos, se eu chegar a ser avô, a televisão estará ai, presentes nas nossas vidas. Diferente. Com diferenças marcantes. Não falaremos da televisão como algo do passado. “Lembra daquele tempo?’’. Espero que a evolução do conteúdo da TV, das opções de conteúdo que a TV nos traz, que essa evolução se dê em um ritmo mais forte, em comparação com que vemos, ou temos visto nos últimos cinco, dez, vinte anos. Com mais rapidez, mais ousadia. Especialmente, nas TVs mais vistas, mais populares. Que se mexem. Que estão se mexendo. Se mexem de um forma, me parecem, muito conservadora.

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