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PROGRAME-SE: Quais os grandes desafios de fazer TV hoje?

 

LECUK ISHIDA: A plataforma televisão exige ter uma consciência hoje. Toda vez que você vai colocar alguma coisa no ar já é uma coisa muito velha. Hoje, com a velocidade, por exemplo, da internet, qualquer coisa que a gente tiver fazendo aqui hoje, daqui a duas horas, já é velho. Já foi comentado, já foi postado, já fizeram um selfie. Então, tudo é muito velho que a gente vê na televisão. Tudo que está na televisão já é velho, pra vocês jovens, pra mim que sou velho (risos). Ainda os meios de comunicação mais tradicionais ainda resolvem. Falando um pouco de televisão ainda. Tem uma coisa muito ambígua assim. O que me dá visibilidade e audiência são os jovens. Mas o que me dá solidez de transmissão, o que me dá solidez no sentido de que mantém o meu ibope, são os velhos. Então tem uma coisa ambígua ainda que a gente vive na televisão.

PROGRAME-SE: É possível pensar no que funciona na TV atualmente?

 

LECUK ISHIDA: Eu acho que por conta da convergência de mídia hoje, a gente não sabe se a televisão tá virando computador, ou o computador tá virando televisão. Os formatos tão ainda se testando. Tá todo mundo reaprendendo fazer televisão, fazer documentário, fazer cinema. Tá todo mundo reaprendendo a fazer de novo tudo isso. Então, a gente tá usando ferramentas antigas pra fazer coisas novas. O mais importante hoje é acompanhar essa velocidade de convergência de mídia. E é bem difícil.

 

PROGRAME-SE: Como você analisa as relações de interatividade estabelecidas pela televisão?

 

LECUK ISHIDA: Qualquer relação, mesmo a relação entre espectador e televisão, ela tem que ser sustentável no seguinte. Ele precisa se auto alimentar. Tanto a televisão precisa servir pro cara, quanto o cara tem que servir pra televisão. Hoje a interatividade permite isso. Você não é só espectador, você é alimentador de conteúdo. Sabe? Rola uma troca muito forte. E é nesse desafio que eu falo bastante. É muito difícil e você chegar realmente num produto que consiga esse transporte de informações, esse jogo de interesse de ser equilibrado o tempo todo. Esse é o grande exercício, esse é o grande desafio que da televisão hoje.

 

PROGRAME-SE: A TV aberta, de alguma forma, está se aproximando da segmentação observada nos canais fechados?

 

LECUK ISHIDA: Eu acho que não. Muito pelo contrário. Eu acho que a postura das TVs abertas ainda é mais de deixar as coisas abrangentes possíveis. E as TVs fechadas, para realmente, um nicho. Alguns canais estão focados na comunicação para a mulher. Outros canais, enfim, para criança. Outro para mais criança ainda. Outros, enfim, para outros tipos de pessoa. Para senhora, terceira idade. Outros só pra vendas, né? Então, a TV aberta, pela própria natureza, deve ser aberta, ter acesso livre. Ela quase que tem o poder tão grande quanto a internet. A internet ainda é segmentada. Você busca ali. A TV aberta, até culturalmente, pensando no brasileiro, ele liga, e às vezes, ele até serve como um rádio. Recentemente eu estava dirigindo um programa que é matinal. Começa sete da manhã. Aos sábados. Que que você vai fazer para alguém, sábado, sete da manhã, ligar a televisão?! A gente tem um estudo de hora a hora, comportamento desse espectador, que é o seguinte: na primeira meia hora, esse telespectador só tá ouvindo. Liga a televisão e fica ouvindo. Então ali serve quase como um rádio. Depois que ela já preparou o café da manhã, aí ele senta pra assistir e o ibope cresce um pouquinho. Aí as crianças já acordam, já tem uma outra transformação. Aí no último momento do programa, você já tá falando pra família inteira, por que até o marido já acordou, já tá com o chinelão lá. Hoje entender quem te assiste, entender qual o comportamento das pessoas que estão assistindo televisão é entender isso. Muda de região pra região. E esse é o problema de equação muito grande que as TVs abertas têm. Porque eles precisam realmente fazer uma coisa genérica, para uma população que não é genérica. Que cada um tem seu costume. Cada um tem seu jeito. Realmente é uma questão realmente complicada.

PROGRAME-SE: Podemos pensar em um fim próximo para a grade de programação convencional?

 

LECUK ISHIDA: Eu acredito. Até porque o formato do negócio televisão, ele tá muito formatado, de forma que você tem a parte de conteúdo e você vai inserindo breaks na programação. E até o próprio nome publicidade, comercial já não faz muito sentido mais. Comercial. Publicidade.  A publicidade tá muito pulverizada. O comercial tá muito pulverizado. A própria publicidade, esses momentos de breaks, vão repensando uma outra forma de se colar na televisão. O conteúdo da internet, essa parte do comercial. O comercial acaba entrando nessa parte do conteúdo. Tá havendo uma mixagem. Realmente vai mudar tudo. Vai mudar a grade, vai mudar o modo. Eu acho que é aquilo que eu falei anteriormente, nessa observação de comportamento das pessoas. Essencialmente, a gente não muda tanto. A gente evolui muito mais tecnologicamente, do que psicologicamente. Psicologicamente a gente pensa como nossos avós. A tecnologia veio pra dá uma avacalhada nisso. Então realmente, tá todo mundo aprendendo junto. Tanto o espectador, quanto nós que fazemos televisão.

PROGRAME-SE: A tecnologia é a principal responsável pelas mudanças de conteúdo televisivo?

 

LECUK ISHIDA: A tecnologia evolui muito mais que a nossa psicologia. A gente é muito mais lento do que a tecnologia anda. Então, eu acho que esse contrassenso é prejudicial. Eu acho que é um norte, que você vai buscando. Existem algumas pessoas que são totalmente às avessas de tudo isso. Eles querem ir para o analógico. Enquanto as outras pessoas tão indo para o 4K. Tem um quê de experimentalismo dos dois lados. As pessoas tão experimentando e tão tentando enxergar o que as pessoas tão enxergando do outro lado. Está todo mundo aprendendo o tempo inteiro.

 

PROGRAME-SE: Qual o espaço do documentário na TV hoje?

 

LECUK ISHIDA: Hoje a gente tem multiplataforma pra gente exibir documentários. A gente tem infinita possibilidades. As redes sociais também é uma plataforma para você colocar documentário. As pessoas assistem ali, sabe? Hoje em dia você tem infinitas possibilidades de acesso. Multiplica-se aí a capacidade de alcance dos documentários.

PROGRAME-SE: E quanto à ficção?

 

LECUK ISHIDA: No Brasil, a gente faz bons filmes. Mas a gente não tem uma indústria de filmes. Um filme não se não paga o segundo, não paga o terceiro. É nesse sentido que eu falo que a gente não tem uma indústria. Você faz um filme hoje, você vai fazer o outro longa daqui a dez anos. Um diretor bacana tem três, quatro filmes em seu currículo, até morrer, sabe? Exceto, sei lá, pessoas como Fernando Meireles, nossos deuses aí. Mas enfim. O mercado entendendo que a gente faz bons filmes, é logico que eles vão tentar fazer com que essa linguagem escorra de outras formas. E a série é um caminho bom. Fazer seriados é um caminho bom. A gente já tem a cultura de novela muito forte. Fazer minis novelas, né? É uma indústria que a gente já criou há muito tempo. A população bebe disso há muito tempo. E com canais alternativos. O on demand é muito importante pra o escoamento desse tipo de produto.

PROGRAME-SE: O ritmo das narrativas tem se alterado por conta de todas essas transformações?

 

LECUK ISHIDA: Quando você conta uma história, você precisa envolver a pessoa de algum modo. Às vezes o envolvimento precisa ser realmente ritmado. Mas às vezes, não. O próprio silêncio já conta muita história. Então depende muito da narrativa que você que imprimir dentro do seu filme, né? Dentro do seu produto. Às vezes, um” nada “é muito mais importante que um monte de cena clipada em cima da outra. Acho que isso varia muito de narrativa. 

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