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PROGRAME-SE: Quais as principais diferenças de produzir para a TV e produzir para a internet?

 

LEO MADEIRA: Eu estava na televisão, no momento eu estava na MTV. Um canal de televisão, no momento em que a internet entrou na linguagem televisiva. Posso falar de dentro da TV como foi um, uma perspectiva de quem viu um tsunami chegando e tentou correr e pegar uma prancha de surf. Mas a verdade que a televisão foi, é varrida, entre aspas pela internet, de uma forma. A exclusividade da mediação que a televisão teve durante muitos anos, hoje ela perdeu e aí os canais não foram capazes de se prepararem propriamente para o tsunami de linguagem que a internet proporcionou. É claro que todo o conteúdo que você faz, independentemente de onde seja, acaba indo parar na internet. Diferente de se produzir um conteúdo especificamente para a internet. A televisão tem um sua linguagem própria, que claro, foi muito atualizada pela ideia da interatividade, pela possibilidade de poder conversar, de haver uma mediação curta ou, ou nula, ou inexistente entre produtor e o telespectador.

PROGRAME-SE: A TV brasileira está conseguindo dialogar com o público?

 

LEO MADEIRA: Acho que não. Não conseguiu no começo e tenta correr atrás. A analogia que eu faço é quando surgiram os e-books, os livros digitais.  Alguns navegadores de livros simulavam a ideia de você passar uma página, como você faz com um livro propriamente. Só que não faz muito sentido. Você ter que ir lá, segurar com um mouse e virar a página. Era uma linguagem nova tentando emular uma linguagem antiga. E a televisão é a linguagem antiga dessa analogia, dessa relação. E a internet, pela ausência de limites proporcionou possibilidades que são infinitas em termos de alcance, de distribuição, geração de conteúdo, de qualquer coisa que você imaginar. A televisão nunca vai conseguir ter essa propriedade que a internet tem, porque a televisão, como a gente sabe, é uma concessão pública, mas que na prática, funciona como uma ferramenta de interesses econômicos privados. Então, a televisão brasileira, ela é muito voltada para a questão comercial. O que move a televisão brasileira, como se sabe, é a questão comercial. O departamento comercial das televisões, em geral, são os mais importantes, posso dizer assim. Das que eu conheço, das que eu tenho amigos e com quem eu converso a respeito. Então tem um gap, uma distância conceitual que nunca vai ser vencida entre TV e internet.

PROGRAME-SE: Quais os principais desafios de quem está em frente às câmeras?

 

LEO MADEIRA: Mais desafiador é criar um conteúdo que seja ao mesmo tempo cativante, um conteúdo que chame atenção, que gere audiência e, que simultaneamente a isso, seja inteligente, seja crítico, e que tenha elementos, camadas de sentido, né? Que tenha uma riqueza semiótica, vamos chamar assim, grande. É um desafio, porque geralmente o que você vê, são coisas que tem um apelo popular, que são feitas para serem gostadas, mas que no fundo dizem pouco ou não vão muito além da superfície. Então, eu acho que o grande desafio, primeiro, é criar conteúdo de qualidade. Segundo, que esse conteúdo siga ao mesmo tempo a lógica comercial.

PROGRAME-SE: Como espectador, o que você acha que realmente funciona na TV?

 

LEO MADEIRA: O que que funciona hoje? O que me parece que tem funcionado são os realities, geralmente formatos copiados. A gente vê programas que dão certo lá fora e que também dão certo aqui no Brasil, porque são bem feitos também, e tal. Tem a excelência técnica dos profissionais do Brasil, a técnica é bem avançada. E muitos profissionais excelentes. Eu acredito que a própria Rede Globo tem investido muito na dramaturgia. A grade da Globo um dia, tem seis, sete, oito novelas? E é claro que tem novelas que têm uma sofisticação, um roteiro bem feito. E tem uma direção de arte... todos os elementos que compõem a cinematografia em geral, que podem ser aplicados também para a linguagem televisiva e que geralmente não são levados em conta em produções baratas, mas quando se tem dinheiro, é mais fácil de você ter profissionais cuidando de cada coisa. Então, geralmente o que dá certo é o que é bem feito. O que dá certo não é só ser visto. Eu olho pra televisão porque também sou estudioso da comunicação e de outras coisas.

PROGRAME-SE: O público está ficando mais exigente?

 

LEO MADEIRA: Eu não sei se o público está mais exigente, porque depende do que, qual tipo de exigência a gente está falando. A televisão é uma arte, entre aspas, em que você precisa ter sempre em mente o outro lado, o receptor, o telespectador. A TV é toda feita em cima da numeração da audiência. Principalmente a TV aberta. A TV acaba se apropriando dos recursos da internet ainda de um jeito que é primitivo. Por exemplo: eu tô vendo lá um jogo de futebol e o narrador, ao invés de comentar o jogo, fica lá dois minutos falando: “Mandar um abraço pro fulano lá de Uberaba”, “Mandar um abraço pro Tcharly lá de Itabuna, que tá assistindo” E eu, sabe? Não é isso! O cara que está dirigindo aquele programa acha que é preciso o tempo todo incluir a participação das pessoas. E a gente tem visto mais e mais programas que têm feito isso. Programas que colocam o público pra julgar se aquilo tá bom, se não tá. Dá pra fazer mil coisas com a televisão também.

 

PROGRAME-SE: Como você analisa o espaço atual da música na TV?

 

LEO MADEIRA: A gente tá falando de uma indústria que sofreu um terremoto. Uma indústria que era um castelo e virou cacos, que é a indústria fonográfica. Se a gente pegar os últimos vinte anos da indústria fonográfica, a gente tem um case de economia, capitalismo, que é inigualável. Então, é difícil falar, porque quando você está falando de indústria fonográfica são mil coisas, mil elementos, que aconteceram, que tem acontecido e que transformaram tudo. Desde a transformação dos próprios sujeito com a música, a maneira como ele consome a música. Já falando da música como produto, a música que vende hoje é a música sertaneja, né? A música mais popular. Essa música está bastante na televisão. E a música do momento em termos comerciais é essa. Os artistas desse gênero estão o tempo todo na televisão, se você reparar. Acho que a televisão dá menos espaço para música porque a música não é algo que, na televisão, mova multidões. As pessoas vão a shows, vão ver seus artistas preferidos e tal. Mas também não gastam mais com CD, com discos. E aí tem uma nova realidade. A MTV, por exemplo, nasceu como um grande instrumento que as pessoas tinham pra conhecer música nova. Muita gente conheceu muita coisa, da minha geração e acima, vendo MTV, porque não tinha internet. Quando veio a internet e a possibilidade de você ouvir o que você queria na hora que você quisesse, e descobrir coisas que você nunca imaginou, sem sair de casa, por exemplo, a MTV perdeu o seu lugar no panteão daquilo que mediava, que permitia, que abria a porta. E aí tiveram que se reinventar, e isso foi o grande, diria que foi a grande semente do fim da MTV, foi o momento que a internet veio e tirou dela esse charme, essa coisa de ser por onde as pessoas descobriam música nova.

PROGRAME-SE: Quais suas perspectivas para o futuro da televisão?

 

LEO MADEIRA: Eu acho que a TV, principalmente a linguagem televisiva como já tem sido, vai ser altamente impactada pela tecnologia. Eu já li futuristas. O japonês que me foge o nome, inclusive, que fala sobre o futuro da tecnologia e que fala, por exemplo, em telas como papel. Telas que não são rígidas, é um papel, mas é uma tela.  Então você tá vendo alguma coisa e tá balançando. Uma lente de contato que te permite acessar a internet. Que já teve o Google Glass, que não deu muito certo. Mas é uma coisa nessa direção. Então, a televisão vai ser muito impactada pelas tecnologias disponíveis a partir de agora. Depende do que vai dar certo e o que não vai dar certo, em termos de tecnologia. A TV vai virar, vai ser assimilada pela internet. A TV subsiste. A TV subsiste porque ela é um instrumento de poder, na mão de famílias oligárquicas, poderosas e que têm uma atuação política no cenário nacional. Isso é um assunto bem interessante, às vezes até mais interessante que a própria linguagem. A TV não é como a internet, esse vento que sopra livre. A TV é algo encaixotado e que vai também sofrer alterações à medida que isso seja permitido pelo poder econômico, que é o que move as pecinhas no aparato televisivo.

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